Como todos os dias que surgiam em meio aos lugares mais tranqüilos, aquele
despertar reservava esperanças e vinha ainda carregado de bagagens que
insistiam em ser transportadas. Rumou pela estrada em busca de preencher os
espaços do tempo com os afazeres diários e apto a se deparar com novos
acontecimentos. Tudo transcorria na mais santa paz até que avistou ao longe um
corpo caído no acostamento e ao lado uma poça de lama. Pensou de imediato como
aquela criatura escapou de não estar submersa naquela água empoçada que de
tanto estar ali já tinha se transformado em má água (ou mágoas).
Parou e rapidamente observou que alguns passantes já estavam
a socorrer aquela mulher, decidiu seguir o seu caminho e ao se afastar um pouco
dali uma intuição acometeu seus pensamentos decidindo voltar e vê melhor o que
estava acontecendo ou até mesmo ajudar.
Retornou com o ar e a responsabilidade de quem poderia
resolver qualquer incidente ou direcionar as providências mais eficazes. Ao se
aproximar ficou inicialmente sem saber o que fazer e com a ajuda de outra
pessoa tentaram acordar aquela mulher que aos poucos gemia com dor no braço que
estava enfaixado em ataduras já gastas. Levantaram com a delicadeza de quem
precisasse de muito mais do que aquele apoio, mas esperavam que nada de ruim
pudesse se agravar. Ao abrir os olhos a mulher se deparou com aquela cena onde
vários curiosos já se acumulavam e como a despertar de um sonho bom (mesmo
caída na estrada ao lado de uma poça de lama) teve que encarar o pesadelo de
uma vida tão amarga e cruel.
Aceitou ser levada a um lugar mais seguro e sentada em um
troco de árvore tomou um copo d’água, suas primeiras palavras foram de revolta
contra o que ela dizia ser ao homem que lhe abandonara e que a tinha espancado. Estava visivelmente embriagada e os sentimentos de raiva, ódio e
vingança se misturavam aquela aparência bêbada que fisicamente era notória mas
que em sua alma estava mais esmolambada e desprezível. Ela tinha permitido que
alguém a tirasse a sua dignidade, a sua paz, a sua identidade e principalmente
a sua vida e, portanto agora estava como que “pagando” por escolhas mal feitas,
mas que já não poderia voltar e refazer o seu passado.
Doeu vê a situação miserável a que chega uma pessoa, como se
vai ao fundo do poço (e ao lado da lama), logo se pôde fazer suposições acerca da
condição humana, da construção do ser em um mundo tão cheio de possibilidades mas que alguns preferem fechar as portas para a sorte traçando um destino sem volta,
pois tudo é cheio de barreiras, de dificuldades e empecilhos que impendem seguir.
A prisão a que a natureza humana impõe encarcera até mesmo
os sonhos mais simples; aquela mulher estava perdida, caída e mesmo
tendo a ajuda de algumas almas caridosas ela tinha que levantar e seguir
sozinha mas estava fraca, sem perspectivas, sem confiança e não tinha mais o
que perder.
Era um anjo caído na estrada...